O diretor literário do clube se levantou, limpou a garganta, ajustou
a gravata, fixou firmemente seus olhos no jovem à sua frente, e, com
uma voz sonora, um pouco marcada por seu ceceio habitual, perguntou:
“Senhor ——, o senhor poderia por favor nos dizer sua opinião
sobre se as chances de casamento de uma mulher aumentam ou diminuem
quando ela se torna uma igual ao homem como trabalhadora remunerada?”
A secretária ajustou seus óculos e segurou o lápis de maneira
alerta sobre o caderno, pronta para anotar qual o lado que sr. ——
tomaria. O sr. —— se mexeu, levantou-se de um golpe só, e
finalmente deu sua opinião. Outro senhor fez o mesmo, e outro, aí
as mulheres se interpuseram, e pularam nos homens, os homens
retaliaram, uma guerra de palavrório se seguiu, e todo o assunto se
encerrou com nada sendo decidido, pró ou contra – o que em geral é
o caso nessas guerras de palavrório. Moi? Bem, eu fiquei pescando e
não disse nada, mas todo o tempo ali algo estava se formando em
minha mente, bem, não se formando, já estava lá. Era isso: por que
uma mulher com bom salário deveria se casar? Pegue a mulher
trabalhadora mediana de hoje em dia. Ela trabalha de cinco a dez
horas por dia, fazendo algum trabalho a mais às vezes, é claro. Seu
trabalho termina e ela vai para casa ou para a pensão em que mora,
conforme o caso. Suas refeições são preparadas para ela, que não
tem que se preocupar com trabalho doméstico, nem com jantares
problemáticos para um marido que procura pelo em ovo, nem com
crianças irritantes para testar sua paciência, nem com economias
mesquinhas no arroz e feijão. Esta mulher tem suas preocupações,
seus problemas monetários, suas dívidas e seus pão-durismos, é
verdade, mas eles só a tornam mais independente, em vez de reduzi-la
a um nível mortal de desespero. Seu dia de trabalho termina no
escritório, escola, fábrica ou loja; o resto do tempo é dela, sem
ser perturbado pelo vai e vem sem descanso das preocupações de um
lar, e ela pode empregá-lo em distrações mentais ou sociais. Ela
não depende dos caprichos de um homem mal-humorado para levá-la às
diversões que desejar. Aqui, no século dezenove, ela é livre para
ir onde bem entender – sendo um lugar de boa moral – sem
comentários alheios. Teatros, concertos, palestras e as diversões
mais leves de seu círculo social estão abertos a ela, que pode ir
pra onde quiser, ver e ser vista, admirar e ser admirada, apreciar e
ser apreciada, sem nenhum pensamento perturbador sobre o leite do
bebê ou o café do marido.
Os rendimentos da mulher são só dela, de maneira incontestável,
sem reservas, sem dividir. Ela sabe com certeza o quanto pode gastar,
quão bem pode se vestir, até onde o dinheiro vai dar. Se houver um
vestido, um livro, uma partitura, um buquê ou móvel que quer, ela
pode comprar, e não precisa pedir conselho a ninguém, nem dar
indiretas ao João que a Dona Fulana comprou um lindo chapéu novo, e
tem um ainda mais lindo e mais barato na Qualquer Coisa Ltda. Para um
espírito independente, há algo de humilhação e de orgulho ferido
no ato de pedir dinheiro, sejam cinco centavos ou quinhentos dólares.
A mulher que trabalha não conhece tal aflição; ela só tem que
consultar sua própria conta, e pronto. No verão ela pega as
economias do inverno, faz a mala e viaja, pouco ou muito, e não tem
ninguém para lhe dizer não – nada para chateá-la a não ser o
excesso da própria bagagem. Há um balanço independente, feliz,
livre e simples no movimento de sua própria vida. Sua mente é
constantemente ampliada pelo contato com o mundo quando trabalha, e
pelos melhores pensamentos das pessoas vivas e mortas que encontra em
livros e periódicos nos momentos de lazer, assim como pelos estudos
da natureza ou contato com outras comunidades quando viaja. Ela não
abusa da liberdade que tem, porque adquiriu, na escola ou na vida,
fortes hábitos de autoconfiança e autossuficiência, pensamento
honesto, discernimento profundo, e acredita convictamente que a
liberdade mais perfeita é o estado em que a humanidade obedece
estritamente e se conforma, sem desvio, às leis mais adequadas ao
seu avanço mútuo.
E por isso a nossa mulher trabalhadora independente contemporânea se
aproxima ao máximo possível do ideal de autoconfiança. Então por
que ela deveria se apressar em desistir dessa liberdade por uma
servidão, às vezes agradável, é verdade, mas que tão
frequentemente se torna irritante e difícil de encarar?
Não é o casamento que censuro, até porque não creio que nenhuma
pessoa sã faria isso, mas essa casamentaria por atacado de meninas
adolescentes, essa pressa em se embarcar num plano desconhecido de
vida para evitar o trabalho. Evitar trabalho! Qual a dona de casa que
se atreve a ter um momento para si mesma?
Casamentos podem ser feitos no céu, mas muito frequentemente são
consumados bem aqui na terra, baseados num desejo masculino de tomar
para si os atrativos físicos de uma mulher, como uma criança deseja
um brinquedo, e um amor inato das mulheres pelos homens, um desejo
louco de não ser ridicularizada pelos tolos como uma “solteirona”,
e um certo desdém delicado pelo trabalho do mundo – preguiça é
um bom nome para isso. A atração de mente para mente, a capacidade
de um complementar as luzes e sombras do outro, a habilidade de
preencher as obrigações de marido ou de esposa – estas qualidades
não entram no contrato. É por isso que temos juizados de divórcio.
E então a nossa mulher independente vai ganhando conhecimento e
experiência em cada ano de sua vida repleta, rica e completa,
aprendendo sobre a humanidade, e, particularmente sobre o outro sexo,
até para evitar ter ídolos com pés de barro, e finalmente, quando
ela consente em carregar o jugo sobre seus ombros, pode até fazer
isso com menos romance e encantamento que suas irmãzinhas que caçoam
dela, mas com a certeza de uma felicidade sólida e mais duradoura.
Por que ela deveria ter tido pressa; foi tudo perdido com o atraso?
“Dizem” que os homens não admiram este tipo de mulher, que eles
preferem uma criatura mais suave, delicada, conquistada, insensata,
que se aninha nos braços dos homens, concorda com tudo o que dizem, e olha para eles como uma raça de deuses que foi solta nesta
terra para a edificação da mulher. Bem, talvez seja verdade, mas há
uma coisa positiva, eles certamente respeitam as mulheres
independentes, e a admiram, também, ainda que à distância, e isso
é alguma coisa. Por outro lado, não importa o quanto uma mulher é
sensata sobre outras questões, quando se apaixona ela é tola o
bastante para ver em seu adorado um verdadeiro Salomão. Carícias?
Ora, ela pode presidir convenções, gesticular com sua sombrinha em
reuniões de conselhos, circular pelas ruas pedindo assinaturas,
brandir o lápis de correção num santuário editorial, martelar
numa máquina de escrever, manchar seu nariz com tinta de uma forma
cheia de tipos de impressão, guiar ideias infantis pelos caminhos
tortuosos de g-a-t-o e r-a-t-o, defender um réu, ou segurar o
bisturi na sala de autópsia, e ainda assim, quando o momento certo
chegar, ela vai se afundar graciosamente no abraço masculino do
amado, enlaçá-lo com seus braços, e se aconchegar tão calorosa e
docemente a seu peito quanto aquela sua irmãzinha que não fez nada
além de pensar em, sonhar com e treinar para este momento. Isso vem
naturalmente, como se vê.
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