sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Bálsamo


Imagine a vida sem desconforto. A vida sem sol demais, sem calor, sem suor grudando na pele, sem pelos colados no corpo. Sem frio, sem blusas de lã que incomodam, sem o ar congelante que irrita o nariz. Sem secura demais, sem umidade sufocante, um ar condicionado perfeitamente regulado à volta de si o tempo todo.
Imagine a vida sem cansaço. Sem costas doloridas ao fim do dia, sem as pontadas no peito que você sentiu ao correr atrás do ônibus. Imagine a vida sem correr atrás do ônibus. A vida sem ônibus, sem jamais ter que pegar ônibus, sem ter que suar o suor alheio, a promiscuidade imunda dos ônibus.
Imagine a vida sem dor - sem tropeçar na calçada, bater o dedinho, perder a unha. A vida sem nunca esfolar os joelhos quando criança, sem cair de cara e perder dois dentinhos de leite. Imagine a vida sem jamais ter quebrado o braço, sem ter o gesso (quente, coçando) assinado pelos colegas de classe. A vida sem uma nota baixa, sem reprovação no vestibular, sem esperar inutilmente pela resposta de uma entrevista de emprego. Viver sem ter que bater ponto.
Imagine a vida sem resfriados. A vida da varíola erradicada, do sarampo quase extinto, uma vida sem viroses enigmáticas, sem conjuntivites purulentas. A vida sem diagnósticos de câncer, sem doenças sem cura, sem agonias prolongadas ou súbitas demais. Imagine a vida sem jamais perder quem se ama antes do tempo.
Imagine a vida sem decepção, sem frustração, sem desilusão, sem dor. Imagine a vida sem amor.

2 comentários:

  1. o amor é carente, então carrega a frustração a tiracolo. desistir do amor dói mais que sofrer por amor.

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  2. Tentei, mas não, não imagino. E não correr atrás de ônibus não seria uma vida, e sim um paraíso.. hahahahaha

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