quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Eles

Primeiro eles cegam os seus olhos, para que você não veja. Porque não há nada errado à sua volta, é evidente que você anda enxergando demais. Eles fazem de madrugada, em silêncio, e quando você acorda o céu, o sol, a face amada, tudo some, sumiu, como o nada, como o absoluto silêncio dos olhos. Se isso não for capaz de silenciar a sua voz, eles cortam a sua língua - e dessa vez não vêm em silêncio, na madrugada às escuras, vêm na própria luz do dia que você não vê e deixam claro, muito claro, o que vão fazer; te anestesiarão e o colocarão numa cadeira, e cortarão a sua língua, rápido, sem dor, sem sangue, sem desespero, sem amor, limpo como deve ser. E se o silêncio não for suficiente e você escrever - você sempre pode escrever, você conserva a caneta entre os dedos e escreve, porque não seria capaz de desaprender, e o que sai pode ser uma garatuja mas com esforço alguém lê, e eles lêem - se você escrever, eles virão novamente. E dessa vez vêm sem pena, sem piedade, virão com estrondo, sem limpeza, com sangue e pavor, e cortarão seus dedos, cada um deles, todos eles, deixando apenas as palmas, as nuas e desfolhadas palmas das suas mãos. E todo o meio que você encontrar para dizer, da maneira como for, eles vão calar, calar e torná-lo um nada, um cotoco de gente sem sensos, sem existência legal, aprisionado em seu pensamento que grita, que berra e não cala.

2 comentários:

  1. Vamos combinar o seguinte. Quando gosto muito não consigo comentar. Perco as palavras. Portanto, se não comentei é porque gostei. Quando não gostar eu digo, o que dificilmente acontecerá.

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